Quer emprego? Não siga dicas de jornais!
Digo isso porque saiu nesse domingo, no jornal O Popular, daqui de Goiânia, uma reportagem na capa do caderno de classificados de emprego mais uma reportagem falando de “Dicas de entrevistas”, com orientações “profissionais” de como o candidato a uma vaga profissional deve se comportar em uma entrevista.
Não fale mal do seu antigo empregador.
Não fale muito.
Não fale pouco.
Fale de você.
Não fale demais de você.
Ria.
Não mostre os dentes.
Sente assim.
Não sente assado.
E mais um monte de bobagens que negam o mais importante de uma entrevista: é um processo dinâmico que se constrói em uma relação. Essa relação entre o entrevistador e o entrevistado que acontece ali, naquela exata hora, e surgem essas malditas reportagens des-ensinando todo mundo a se comportar. Como se existisse receita de bolo!
Qualquer babuíno com dois neurônios sabe que um processo seletivo visa encontrar a melhor pessoa naquele momento para aquela vaga específica. Não existem regras gerais, e quem acredita que existam essas regras gerais é capaz de acreditar que se entupir a caixa de mensagens dos amigos com mensagens burras vai fazer seu orkut ficar verde. Confesso que não entendo o motivo de querer que o orkut fique verde, mas gente estúpida existe em todo canto.
Enfim, um jornal que é líder de circulação na cidade, sendo um dos de maior circulação do centro-oeste inteiro se presta ao ridículo de publicar um amontoado de clichês e sandices como se estivesse prestando um serviço ao público desempregado.
O sujeito que procura emprego não merece ser tratado com tanto escárnio. É uma pessoa que – em sua imensa maioria – está passando uma fase de muita dificuldade, dívidas, cobranças da família e da sociedade em geral, queda de auto-estima, e me vem uma imbecil que se diz jornalista perder uma página inteira de um jornal para publicar essa porcaria e confundir ainda mais uma pessoa que precisaria antes de orientação embasada, de formação adequada e de amparo. É um pecado recorrente.
Não passamos um ano sem algum cretino ter essa idéia maravilhosa e empulhar os leitores ávidos por soluções mágicas com esses textos enormes recheados de pedaços de informações coletadas em alguma pesquisa googlica.
E o texto ainda se contradiz, porque no único momento de sensatez do texto inteiro, uma consultora – e que pecado não ter o nome dela anotado, pois merece loas – instrui que a única receita para se “dar bem” em uma entrevista é ser autêntico, honesto, sincero e qualquer outro termo que lembre a palavra VERDADE. Conseguir um emprego falseando seu comportamento em uma entrevista é somente uma forma de conseguir remuneração pelo seu sofrimento. É arrumar um emprego que não serve ao seu perfil, que não atende a sua expectativa, que enfim não vai lhe permitir ser feliz no trabalho, e por mais que queiram negar os céticos, isso é possível sim: Ser feliz no trabalho.
Lembro da época de faculdade quando esse mesmo jornaleco publicou uma matéria copiada de alguma empresa de clipping ou coisa parecida, que falava de dicas para o teste HTP. Para quem não é do ramo, esse teste é aquele em que o sujeito é solicitado a fazer alguns desenhos, e o mais comentado sempre era o da árvore.
Faça raízes na árvore.
Desenhe frutos.
Não desenhe frutos grandes.
Ponha chão.
Evite esse tipo de chão.
Linhas grossas revelam isso de você.
Linhas finas revelam aquilo do diabo que te carregue.
E o teste que tinha sua validade para algumas atividades (eu mesmo nunca gostei dele) perdeu completamente sua utilidade, porque todo maluco que tinha lido a matéria desgraçada já tinha um desenho pronto na cabeça que nunca era o desenho original que ele poderia ter imaginado livremente, sem orientações e de forma criativamente autêntica.
Claro que isso ainda acontece porque a classe psicológica é muito desunida. Isso é até assunto para outro post um dia desses. Porque só isso explica e justifica tanta barbaridade cometida contra sistemas de nossa atividade profissional que ainda se perpetuam.
Lamentavelmente um monte de processos seletivos serão falhos por causa de matérias como essas, pois candidatos falsearão o que são, entrevistadores irão procurar por entrelinhas e mensagens sub-liminares, e vagas permanecerão sendo preenchidas por “atores” e “atrizes”de entrevista.
Muito agradecido, O Popular, por dificultar ainda mais a contratação de profissionais.
Pulhas!